COMPUTAÇÃO QUÂNTICA – a mais recente Patent TREND

A computação quântica é uma das mais fascinantes e revolucionárias tendências tecnológicas atuais. Como usualmente sucede em Ciência, o seu desenvolvimento é acompanhado da procura por proteção da propriedade intelectual relativa às inovações nesta matéria.

De acordo com um relatório do Instituto Europeu de Patentes (IEP) publicado em janeiro deste ano, o número de pedidos de patente relacionados com computação quântica cresceu significativamente na última década, num ritmo que ultrapassa o da evolução do número de pedidos em qualquer outro ramo. Além desta circunstância, vale notar que mais de 20% dos pedidos de patente internacionais nesta matéria foram apresentados na última década. Também importante é a dimensão colaborativa da evolução tecnológica em causa (designadamente entre instituições de investigação, como as conhecidas universidades de Yale e Harvard, e empresas interessadas), sugerida pelo facto de aproximadamente um em cada 10 pedidos de patente europeus neste domínio ter vários requerentes.  

Os dados expostos apontam uma tendência, da qual se pode concluir que há elevadas expetativas de retorno económico neste contexto, e uma orientação estratégica para a comercialização de tecnologias quânticas a nível global, com empresas como a IBM, a Google e a Microsoft na linha da frente desta corrida. A tal não é alheio o facto de esta tecnologia poder incrementar o desenvolvimento de outras áreas técnicas, como a inteligência artificial,a análise de big data, o desenvolvimento de novos medicamentos e vacinas (áreas em que a computação quântica pode diminuir em muito o tempo das tarefas de análise e investigação), o setor financeiro (por exemplo, através da capacidade de predizer resultados de operações em bolsa) ou a criptografia (através da criação de passwords ou dados encriptados tendencialmente impossíveis de violar, porque assentes em tecnologia quântica). Também ciente da importância desta tendência, a Comissão Europeia lançou em 2018 a Quantum Flagship Initiative, um ambicioso projeto de investigação a 10 anos que junta mais de 5000 cientistas, engenheiros, empreendedores e decisores, é dotado de um orçamento que ultrapassa os mil milhões de euros e reflete a vontade europeia de consolidar um papel de liderança nesta área. 

Mas do que estamos a falar quando nos referimos a “computação quântica” e o que justifica o entusiasmo em seu torno?

Em termos simples, pode dizer-se que esta nova geração de computadores permite realizar em alguns segundos tarefas complexas e quase impossíveis para um computador clássico.

A palavra “quântica” é proveniente da mecânica quântica utilizada pelo sistema, que aproveita os ensinamentos da física quântica, dedicada ao estudo e descrição das partículas atómicas e subatómicas, como os eletrões e os protões, e do respetivo comportamento, para desenvolver uma computação mais avançada, que supera várias limitações da informática tradicional.

Em particular, este ramo assenta no princípio da superposição da matéria, segundo o qual um sistema físico, como um eletrão, existe parcialmente e em simultâneo em todos os estados teoricamente possíveis antes de ser medido/determinado, e no princípio do entrelaçamento quântico, que ensina que duas ou mais partículas quânticas podem manter uma forte conexão ainda que muito distantes e sem ligação física.

No limite das suas capacidades, um computador quântico é capaz de armazenar mais dados por unidade de informação, operar com algoritmos mais eficientes e realizar várias operações simultâneas, assim permitindo a análise de grandes quantidades de dados que os sistemas computacionais tradicionais não conseguiriam processar num período razoável. Mas não se pense que se trata apenas de um computador mais desenvolvido e rápido – na realidade, um computador quântico é um aparelho bastante diferente, que tem na base conhecimento científico mais profundo do que aquele que originou os computadores que conhecemos.

A computação quântica usa como unidade básica de informação o qubit – uma aglutinação dos termos quantum e bit – ao invés do convencional bit. A principal diferença reside na sua capacidade de admitir a sobreposição de zeros e uns (os dígitos do sistema binário em que assenta toda a computação), enquanto o bit só pode representar um valor em simultâneo: zero ou um. É nesta sobreposição de estados, ou natureza não binária, do qubit, que residem os superpoderes – desde logo, uma velocidade exponencialmente superior – dos computadores quânticos, comparativamente a um computador tradicional. Programar um computador quântico, ou desenvolver modelos de computação quântica, consiste sumariamente em elaborar uma sequência de manipulações de qubits de natureza probabilística que, no final do processo computacional, tenham a maior probabilidade possível de alcançar o resultado desejado. A ideia de abdicar de valores precisos (um e zero) e permitir a existência de incerteza – ou seja, manter intacta a superposição – é fundamental para o funcionamento da tecnologia.

Entre as principais diferenças face à computação tradicional, contam-se (i) o facto de a computação quântica não ter um código próprio padronizado para programação (como Java ou Python); (ii) a maior simplicidade da composição de um computador quântico, que é, por exemplo, desprovido de memória e processador, assentando o funcionamento nos referidos qubits; (iii) e o facto de os computadores quânticos não se destinarem, como os computadores tradicionais, ao uso pessoal generalizado (o seu uso restringir-se-á, à partida, ao contexto empresarial e tecnológico).

A realidade, apesar de aliciante, não é isenta de inconvenientes: os computadores quânticos precisam de condições atmosféricas e de isolamento muito específicas para assegurar o seu correto funcionamento. Nomeadamente, uma pressão atmosférica quase inexistente, uma temperatura ambiente próxima do zero absoluto (o limite inferior de temperatura na natureza, que equivale a -273,15 °C) e isolamento do campo magnético terrestre, para evitar que os átomos se movam e choquem entre si ou interajam com partículas externas, o que provoca falhas. Além disso, os sistemas que aqui abordamos funcionam durante períodos muito curtos, o que dificulta o armazenamento da informação e a recuperação de dados.

Genericamente, os desenvolvimentos nesta matéria, inclusive os que dão azo aos pedidos de patente acima referidos, prendem-se, por exemplo, com modelos de computação quântica, ferramentas de mitigação de erros neste contexto (como o colapso indesejado do estado dos qubits), aplicações práticas de algoritmos quânticos, bem como dispositivos usados na construção deste tipo de computadores, que atualmente são de grandes dimensões e podem ocupar uma divisão inteira. Contrariamente aos algoritmos clássicos, que estão na base do funcionamento dos computadores que usamos quotidianamente, os algoritmos quânticos manipulam qubits, estando ainda em desenvolvimento o panorama de componentes físicos em que podem basear-se estes sistemas (na computação tradicional, os mais comuns são os transístores e os semicondutores).

A proteção da propriedade intelectual relativa a invenções no campo da computação quântica pode, como noutros domínios científicos, ser vista pelo menos de duas perspetivas. Por um lado, a ideia de que inexiste proteção suficiente ou eficaz, que pode gerar desincentivo económico à inovação e um abrandamento do investimento em investigação científica, o que é preocupante em áreas onde ainda se está a iniciar o caminho e onde também por isso se enfrentam custos e riscos mais significativos (por exemplo, imprevisibilidade do tempo necessário para realizar uma descoberta). Por outro lado, pode existir a perceção de um nível desproporcionado de proteção, ou seja, a ideia de que praticamente todos os desenvolvimentos tecnológicos já se encontram abrangidos por exclusivos de exploração, ou de que o objeto destes direitos de exclusivo é excessivamente abrangente. Isto pode limitar a proteção de invenções subsequentes (que precisam, desde logo, de ser novas e não óbvias face ao estado da técnica anterior para poderem ser patenteáveis) e/ou afetar negativamente a livre concorrência e acabar por também desincentivar a investigação e inovação no domínio em causa. Em qualquer caso, e não havendo sinais de abrandamento nesta dinâmica evolutiva durante os próximos anos, como antecipado pelo relatório do IEP recentemente publicado, resta esperar que a inovação e colaboração tecnológicas em apreço, que se esperam verdadeiramente impactantes na próxima década, estendam, tanto quanto possível, os benefícios obtidos a toda a sociedade, sem prejuízo da concessão de patentes para invenções relacionadas com tecnologias quânticas. Com efeito, em face de avanços sem precedentes num domínio tecnológico com capacidade de revolucionar setores tão distintos como os da privacidade, saúde, cibersegurança e financeiro, não há como não ter as expetativas bem elevadas!

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